por José Dirceu
Uma das principais avaliações que podemos fazer das manifestações
ocorridas em junho é que o povo brasileiro quer ser escutado. Mais do
que votar a cada quatro anos, a população, de maneira legítima, quer
fazer parte do processo democrático continuamente. Assim, encontrar
canais de diálogo e oferecer instrumentos de participação efetivos deve
ser uma preocupação de qualquer governante que tenha escutado a voz das
ruas e esteja sensível a ela.
Para ficar mais próximo de uma parcela importante dos brasileiros que
hoje se conecta à rede mundial de computadores, especialmente dos mais
jovens, que são os principais usuários de mídias sociais, o governo
federal acaba de implementar o Observatório Participativo da Juventude,
ou apenas Participatório. A nova ferramenta, que vem sendo desenvolvida
desde 2011, será um espaço para comunicação e interação entre jovens,
pesquisadores, formadores de opinião e gestores de políticas públicas,
primordialmente aquelas voltadas para a juventude.
A Câmara dos Deputados, por sua vez, criou uma comunidade virtual
dentro do portal e-Democracia para discutir e receber sugestões da
sociedade sobre a reforma política. Os debates serão acompanhados pelo
coordenador do grupo de trabalho que analisa o tema, deputado federal
Cândido Vaccarezza (PT-SP), que poderá incluir as sugestões no texto da
proposta.
Ainda que a reforma política seja assunto de complexidade suficiente
para que se ouça a sociedade por meio de um plebiscito —proposta
sugerida pela presidenta, Dilma Rousseff, e rapidamente refutada pela
maioria dos partidos (exceto PT, PDT e PCdoB) —, instrumentos como esse
portal são bem-vindos e podem ampliar a participação dos cidadãos
brasileiros nesta reforma tão necessária ao nosso sistema político e
eleitoral.
Inspirado nas mídias sociais, o Participatório tem como proposta
tornar-se um ambiente virtual interativo, com dinâmica integrada às
redes sociais e blogs, para permitir que os diálogos que estão ocorrendo
nesses outros espaços possam alimentá-lo e vice-versa. A ideia é
estimular por meio de debates e mobilizações a participação das pessoas
nas discussões de temas de interesse público e na elaboração de
políticas públicas do governo.
O espaço poderá realizar consultas aos jovens brasileiros e auxiliar
tanto na produção de conhecimento como na divulgação de conteúdos
relacionados a ações e políticas já existentes. O site ainda está
funcionando de forma experimental, mas qualquer brasileiro poderá fazer
parte do Participatório realizando um simples cadastro.
As duas ferramentas, apesar de bastante diferentes, já que o
Participatório se constitui um projeto mais arrojado e elaborado do que o
portal sobre a reforma política, são bastante oportunas neste momento
em que se evidencia a necessidade de maior interação entre os poderes da
República e a população. Porém, é imprescindível que o diálogo, de
fato, se estabeleça, ou seja, que os representantes tanto do poder
Executivo quanto do Legislativo interajam nessas ferramentas.
A criação de canais de comunicação e de boa informação é
indispensável para que o governo e o Legislativo se comuniquem mais e
melhor com a população e para que aprofundem o diálogo com a juventude.
As plataformas digitais e os novos meios de comunicação têm papel
central na transformação das ferramentas de participação popular.
Inclusive, foi através da internet e das redes sociais que os debates em
torno das manifestações se intensificaram e, com a retransmissão de
fotos, vídeos e textos, cumpriram também a função de noticiar os
acontecimentos.
A participação política e social da população, que deve apontar de
forma permanente as melhorias que deseja ver concretizadas no seu dia a
dia, precisa ser continuamente estimulada, tanto com iniciativas como o
Participatório, como através da multiplicação dos espaços de
interlocução já usuais entre o governo e a sociedade civil, como
conselhos, conferências, audiências públicas e mesas de diálogo —justiça
seja feita— bastante ampliados nos últimos dez anos, no âmbito federal.
A construção de uma cidadania ativa e o aperfeiçoamento da nossa
democracia passam necessariamente por um tipo de participação que se
faça presente não apenas no momento solene do voto e na reivindicação de
direitos, mas também na formulação de mudanças, na implementação de
reformas e na garantia desses direitos. As nossas instituições políticas
precisam assegurar esse tipo de participação cidadã e essa é uma das
razões principais pela qual a reforma política não pode, mais uma vez,
"morrer na praia".
José Dirceu é ex-ministro do governo Lula e escreve pro Blog do Dirceu
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